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NOVA SÚMULA DO STJ DESCARTA PRISÃO CIVIL DE DEPOSITÃRIO JUDICIAL INFIEL

SÚMULAS

Agora é súmula: "Descabe a prisão civil do depositário judicial infiel". O texto do projeto apresentado pelo ministro Felix Fischer foi aprovado, por unanimidade, pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça.

O entendimento tem como referência o artigo 5º, LXVII, da Constituição Federal de 1988, o artigo 543-C, do Código de Processo Civil, o artigo 7º, parágrafo 7º, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, e artigo 2º, parágrafo 1º da Resolução 08/2008-STJ. E pacifica a visão do STJ sobre o tema.

"O Supremo Tribunal Federal - no dia 3 de dezembro de 2008, por ocasião do julgamento do HC 87585/TO - fixou o entendimento de que os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos, aos quais o Brasil aderiu, têm status de norma supralegal, razão pela qual pacificou o entendimento quanto à impossibilidade de prisão civil de depositário judicial infiel", disse o desembargador Carlos Fernando Mathias, então convocado pelo STJ, no julgamento do hábeas corpus 115.892, julgado pela Quarta Turma em março de 2009.

A Corte Especial corroborou tal entendimento ao julgar, pelo rito da Lei dos Recursos Repetitivo, o Resp 914.253-SP, da Fazenda Pública do Estado de São Paulo, que ajuizou execuções fiscais para a cobrança de ICMS, proveniente de débito declarado e não pago. Houve a penhora de bens, com nomeação de depositário, do qual foi requerida a prisão civil, em virtude de não terem sido encontrados os bens, que seriam objeto do leilão.

O juízo singular indeferiu o pedido de prisão, ordenando a intimação da executada para que indicasse onde estariam os referidos bens, sob pena de imposição de multa, nos termos do artigo 601 do CPC. A Fazenda Estadual interpôs agravo de instrumento, que foi desprovido, ao fundamento de que a medida extrema acabaria por violar o Estatuto do Idoso, haja vista a idade da depositária (84 anos).

No recurso especial, a Fazenda alegou ofensa aos artigos 148, 902 e 904 do CPC; 627, 629 e 652 do Código Civil, bem como ao artigo 5º, LXVII da CF/88. Argumentou que o depositário deveria zelar pela guarda e conservação dos bens penhorados, consoante previsão expressa do Código Civil, uma vez que atuaria como auxiliar da justiça, mister de direito público. Deveria responder, então, civil e criminalmente pelos atos praticados em detrimento da execução.

A Corte Especial do STJ negou provimento ao recurso. Segundo lembrou o ministro Luiz Fux, em seu voto, o Supremo Tribunal Federal consolidou entendimento no sentido de que a incorporação do Pacto de São José da Costa Rica ao ordenamento jurídico brasileiro com status de norma supralegal restringiu a prisão civil por dívida ao descumprimento voluntário e inescusável de prestação alimentícia. "Com isso, concluiu aquela Corte Suprema que os tratados internacionais de direitos humanos que tratam da matéria derrogaram as normas infralegais autorizadoras da custódia do depositário infiel", acrescentou.

Com a edição da súmula, basta a sua indicação pelo relator quando do julgamento de casos iguais.

A nova Súmula nº. 419 do STJ trata do descabimento da prisão civil, mais especificamente do depositário judicial infiel.

A regra constitucional disposta na primeira parte do no inciso LXVII do art. 5º, consiste na impossibilidade da prisão civil por dívida, os atos negociais não terão a força de viabilizar a prisão de quem quer que seja. Porém, a segunda parte traz duas exceções. Assim, é admitida a prisão civil em caso de:

 1. inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia;

 2. depositário infiel.

Com base nas exceções acima, muitas prisões civis de depositários infiéis foram decretadas, até porque a jurisprudência pátria sempre direcionou-se no sentido da constitucionalidade do art. 5º, LXVII, da CR/88.

Porém, a partir do julgamento do Recurso Extraordinário 466.343/SP surge uma nova interpretação do texto constitucional, que provoca uma guinada histórica no entendimento do Plenário no sentido de não mais subsistir, no sistema normativo brasileiro, a prisão civil por infidelidade depositária, independentemente da modalidade de depósito, trate-se de depósito voluntário (convencional) ou cuide-se de depósito necessário, como o é o depósito judicial.

Originalmente, a questão proposta no RE 466.343 tratava em aferir a possibilidade da prisão civil do devedor fiduciante, tendo em vista sua equiparação, por lei, ao depositário infiel. Ou seja, questionou-se a possibilidade da legislação ordinária ampliar o conceito constitucional de "prisão do depositário infiel".

Com relação a prisão do devedor fiduciante, o brilhante voto do Ministro Relator Cezar Peluso, acompanhado por todos, deixou claro que não se confunde contrato de alienação fiduciária com contrato de depósito, e inclusive não pode ser a ele equiparado para o fim de incidir a exceção constitucional da prisão civil.

No mesmo RE 466.343, o Ministro Gilmar Mendes, destacou que o Brasil em 1992 ratificou, sem qualquer reserva o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica, e que ambos dispõem respectivamente que:

Art. 11 - Ninguém poderá ser preso apenas por não poder cumprir com uma obrigação contratual.

Art. 7º

(...)

7. Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar.

Tendo em vista que as regras internacionais acima expostas somente admitem a prisão civil na hipótese do devedor de alimentos, a adesão do Brasil aos diplomas internacionais significa que não há mais base legal para a prisão civil do depositário infiel, pois o caráter especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos lhes reserva lugar específico no ordenamento jurídico, que o Pleno da Excelsa Corte, no RE 466.343, reconheceu como status normativo supralegal, ou seja, hierarquia abaixo da Constituição, mas superior à lei ordinária, o que significa dizer que toda lei antagônica às normas emanadas de tratados internacionais sobre direitos humanos é destituída de validade.

A propósito o Ministro Gilmar Mendes assinalou que a natureza especial dos atos normativos internacionais que cuidam dos direitos humanos permite que sua incorporação ao direito interno tenha o condão de paralisar a eficácia jurídica de todas e qualquer displina normativa infraconstitucional com ela conflitante.

Diante do exposto, é certo que as normas infra-legais autorizadoras da prisão civil do depositário infiel deixaram de ter eficácia normativa. Mas, e a norma constitucional que prevê expressamente a prisão civil do depositário infiel?

Mais uma vez, brilhantemente, Ministro Gilmar Mendes esclarece que: "a evolução jurisprudencial sempre foi uma marca de qualquer jurisdição de perfil constitucional. A afirmação da mutação constitucional não implica o reconhecimento, por parte da Corte, de erro ou equívoco interpretativo do texto constitucional em julgados pretéritos. Ela reconhece e reafirma, ao contrário, a necessidade da continua e paulatina adaptação dos sentidos possíveis da letra da Cosntituição aos câmbios observados numa sociedade que, como a atual, está marcada pela complexidade e pelo pluralismo. A prisão civil do depositário infiel não mais se compatibiliza com os valores supremos assegurados pelo Estado Constitucional, que não está mais voltado apenas para si mesmo, mas compartilha com as demais entidades soberanas, em contextos internacionais e supranacionais, o dever de efetiva proteção dos direitos humanos. Tenho certeza que o espírito dessa Corte, hoje, mais do que nunca, está preparado para essa atualização jurisprudencial".

Sobre o tema vejamos o entendimento Ministro Celso de Mello, proferido no HC 96772 de sua relatoria: A INTERPRETAÇÃO JUDICIAL COMO INSTRUMENTO DE MUTAÇÃO INFORMAL DA CONSTITUIÇÃO. - A questão dos processos informais de mutação constitucional e o papel do Poder Judiciário: a interpretação judicial como instrumento juridicamente idôneo de mudança informal da Constituição. A legitimidade da adequação, mediante interpretação do Poder Judiciário, da própria Constituição da República, se e quando imperioso compatibilizá-la, mediante exegese atualizadora, com as novas exigências, necessidades e transformações resultantes dos processos sociais, econômicos e políticos que caracterizam, em seus múltiplos e complexos aspectos, a sociedade contemporânea. HERMENÊUTICA E DIREITOS HUMANOS: A NORMA MAIS FAVORÃVEL COMO CRITÉRIO QUE DEVE REGER A INTERPRETAÇÃO DO PODER JUDICIÃRIO. - Os magistrados e Tribunais, no exercício de sua atividade interpretativa, especialmente no âmbito dos tratados internacionais de direitos humanos, devem observar um princípio hermenêutico básico (tal como aquele proclamado no Artigo 29 da Convenção Americana de Direitos Humanos), consistente em atribuir primazia à norma que se revele mais favorável à pessoa humana, em ordem a dispensar-lhe a mais ampla proteção jurídica. - O Poder Judiciário, nesse processo hermenêutico que prestigia o critério da norma mais favorável (que tanto pode ser aquela prevista no tratado internacional como a que se acha positivada no próprio direito interno do Estado), deverá extrair a máxima eficácia das declarações internacionais e das proclamações constitucionais de direitos, como forma de viabilizar o acesso dos indivíduos e dos grupos sociais, notadamente os mais vulneráveis, a sistemas institucionalizados de proteção aos direitos fundamentais da pessoa humana, sob pena de a liberdade, a tolerância e o respeito à alteridade humana tornarem-se palavras vãs. - Aplicação, ao caso, do Artigo 7º, n. 7, c/c o Artigo 29, ambos da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica): um caso típico de primazia da regra mais favorável à proteção efetiva do ser humano".

Com relação a prisão do depositário judicial infiel, foco da Súmula 419 em comento, não obstante seu dever zelar pela guarda e conservação dos bens penhorados, consoante previsão expressa do Código Civil, uma vez que atua como auxiliar da justiça, tendo em vista a nova diretriz traçada no julgamento do emblemátivo Recurso Extraordinário n.º 466.343, as regras internas autorizadoras da custódia do depositário infiel não tem mais eficácia normativa.

Por fim, vale ressaltar que a Corte do STF, há três meses, editou a Súmula Vinculante nº. 25 com o seguinte teor: "É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito".

 

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